Nos termos legais, a publicação do decreto que marca a data das eleições dá início a um período em que se impõem deveres reforçados de neutralidade e imparcialidade às entidades públicas, o que implica, designadamente, a proibição de divulgar atos, obras, programas ou serviços através de meios institucionais (redes sociais, sites, faturas, outdoors, entre outros).
Significa, portanto, que só é permitida publicidade institucional se estiver em causa uma grave e urgente necessidade pública (ex: alertas, interrupções de serviços, deveres legais), pois é essencial, no período em causa, proteger a integridade do processo eleitoral e garantir igualdade de oportunidades entre candidaturas.
Assim, a publicação do Decreto n.º 8/2025, de 14 de julho, que fixa a data das eleições gerais para os órgãos das autarquias locais para o dia 12 de outubro de 2025, constitui um marco jurídico que desencadeia um conjunto de efeitos relevantes para as autarquias locais, tanto do ponto de vista administrativo como do ponto de vista comunicacional, institucional e político. Embora os órgãos autárquicos mantenham a plenitude dos seus poderes até à realização das eleições e à subsequente instalação dos novos eleitos, a definição da data do sufrágio dá início a uma fase de maior exigência em matéria de neutralidade institucional, transparência e contenção na atuação pública.
Exercício de competências dos órgãos municipais
Desde logo, é importante sublinhar que a mera fixação da data das eleições não implica, por si só, qualquer suspensão de competências ou perda de poderes dos órgãos municipais. Os órgãos autárquicos mantêm-se plenamente em funções, podendo continuar a deliberar,
executar atos de gestão corrente e extraordinária, aprovar regulamentos, celebrar contratos, lançar concursos públicos e exercer os demais poderes que lhes estão legalmente atribuídos.
No entanto, ao aproximar-se a data das eleições e especialmente após o ato eleitoral, os órgãos cessantes passam a encontrar-se em gestão corrente, nos termos do artigo 9.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro (na redação vigente), o que implica a limitação à prática de atos estritamente necessários à boa administração e funcionamento dos serviços, sem comprometer a margem de ação dos novos titulares a eleger.
Limitações à publicidade institucional e à comunicação pública
A implicação mais imediata e sensível decorre, contudo, da aplicação do regime jurídico da publicidade institucional e da comunicação pública durante o período eleitoral.
Nos 60 dias que antecedem o início da campanha eleitoral - isto é, a partir de 29 de julho de 2025, e até ao fim do processo eleitoral, vigora a proibição de:
Publicidade institucional promovida por quaisquer órgãos das autarquias locais, salvo em casos de necessidade pública urgente e inadiável, devidamente justificada;
Divulgação de obras, projetos ou ações que possam ser percecionadas como promoção institucional ou pessoal dos eleitos locais;
Utilização de meios e canais institucionais (sites, redes sociais, newsletters, outdoors, revistas municipais, imprensa local com financiamento público, etc.) para efeitos de valorização política ou propaganda indireta;
Realização de eventos com carácter comemorativo, inaugurativo ou promocional, caso estejam associados a obras públicas ou projetos concluídos durante este período.
Estas limitações visam garantir, conforme já referido, a neutralidade das instituições públicas e evitar qualquer forma de condicionamento do eleitorado ou favorecimento indevido de candidaturas por parte dos titulares de cargos públicos.
A CNE - Comissão Nacional de Eleições, nas suas várias e sucessivas Notas Informativas, tem sido clara e reiterada na sua postura sobre este ponto: a proximidade do período eleitoral exige contenção acrescida por parte das autarquias, recomendando-se que se evite qualquer atuação que, ainda que formalmente legal, possa ser interpretada como tentativa de capitalização política da ação municipal.
A proibição da publicidade institucional está consagrada no artigo 10.º da Lei n.º 72-A/2015, na vertente de proibição de propaganda política através de meios de publicidade comercial, considerando-se como tal qualquer meio (internet, redes sociais, Facebook, revista municipal, flyers, entre outros).
Refere a Comissão Nacional de Eleições (CNE):
“Esta proibição, conjugada com a sujeição aos especiais deveres de neutralidade e imparcialidade, visa impedir que as entidades públicas, através dos meios que estão ao seu dispor, os utilizem a favor de determinada candidatura em detrimento das demais, inserindo-se aqui um fator de desequilíbrio entre elas, afetando sobremaneira o princípio – ínsito em todas as leis eleitorais – da igualdade de oportunidades das candidaturas, plasmado na alínea b), do n.º 3, do artigo 113.º da CRP”.
Porém, “a Comissão entende que devem ser excecionadas as publicações autárquicas (órgão oficial de comunicação de um município ou freguesia), desde que respeitando a cadência regular da sua periodicidade, tenham um conteúdo objetivo, contendo-se dentro dos limites do relato isento dos factos, sendo absolutamente vedado que assumam uma função de promoção, direta ou indireta, da atividade do órgão, bem como de um candidato ou candidatura, quer através do texto, quer das imagens utilizadas, nomeadamente através da sua sistemática e repetida difusão”.
Conforme tem veiculado aquela Comissão Nacional de Eleições (CNE), estes normativos implicam designadamente a proibição de uso de expressões como “promessa cumprida”, “fazemos melhor” ou quaisquer outras que pretendam enaltecer o órgão, o seu titular ou a atividade de qualquer deles, que possa pôr em causa a igualdade e imparcialidade na eleição para a respetiva autarquia local.
Como a CNE tem informado, na senda do disposto expressamente no artigo 41.º, n.º 1 da LEOAL, “Como é possível a reeleição para os órgãos das autarquias locais, é comum os respetivos titulares serem também candidatos, o que os obriga a estabelecer uma estrita separação entre o exercício do cargo e o seu estatuto de candidatos e proíbe a utilização dos cargos para obter vantagens ilegítimas”.
“Neste sentido, é elucidativo o Acórdão TC n.º 586/2017, ao determinar que estes normativos prosseguem um desiderato de garantia de igualdade entre os vários concorrentes que se sujeitam ao ato eleitoral. Tal igualdade há-de manifestar-se, também, na separação clara entre o património das entidades públicas e os recursos utilizados pelos concorrentes às eleições. Dito de outro modo, a garantia de igualdade demanda que os titulares de entidades públicas, mormente os que se pretendam recandidatar, não possam, por via do exercício dessas funções, afetar os recursos e estruturas da instituição à prossecução dos interesses da campanha em curso”.
Daí que a CNE ensine que, “Em geral, encontram-se proibidos todos os atos de comunicação que visem, direta ou indiretamente, promover junto de uma pluralidade de destinatários indeterminados, iniciativas, atividades ou a imagem de entidade, órgão ou serviço público, que nomeadamente contenham slogans, mensagens elogiosas ou encómios à ação do emitente ou, mesmo não contendo mensagens elogiosas ou de encómio não revistam gravidade ou urgência”.
Como aí conclui, “No fundo, a lei pretende impedir que, em período eleitoral, a promoção pelas entidades públicas “ de uma atitude dinâmica favorável quanto ao modo como prosseguiram ou prosseguem as suas competências e atribuições, coexista no espaço público e comunicacional com as mensagens de propaganda das candidaturas eleitorais, as quais podem, por essa via, objetivamente, favorecer ou prejudicar” (cf. Acórdão TC n.º 545/2017). E continua, o mesmo aresto: Por assim ser, entendeu o legislador que, para o funcionamento do princípio da igualdade de oportunidade e de tratamento das diversas candidaturas (artigo 113.º, n.º 3, al. b), da Constituição), as prerrogativas de divulgação institucional das entidades, órgãos ou serviços públicos deveriam ceder no período eleitoral, salvo em casos de necessidade pública urgente.”
Algumas exceções
Mas a lei prevê, algumas exceções, desde logo no citado artigo 10.º da Lei n.º 72-A/2015, que afasta da proibição de propaganda política através de meios
de publicidade comercial, os anúncios publicitários, como tal identificados, em publicações periódicas desde que se limitem a utilizar a denominação, símbolo e sigla do partido, coligação ou grupo de cidadãos e as informações referentes à realização de um determinado evento, bem como anúncios publicitários nas estações de radiodifusão e bem assim nas redes sociais e demais meios de expressão através da internet.
Nesta senda, a própria CNE refere expressamente ser “aceitável que as entidades públicas veiculem determinado tipo de comunicações para o público em geral, informando sobre bens ou serviços por si disponibilizados, quando tal comunicação seja imprescindível à sua fruição pelos cidadãos ou seja essencial à concretização das suas atribuições”5, bem como mantenham as “publicações com caráter continuado, como sítios na internet, páginas em redes sociais ou publicações institucionais” 6.
Regras sobre a campanha eleitoral e o uso de recursos públicos
O período oficial de campanha eleitoral decorrerá entre 28 de setembro e 10 de outubro de 2025. Durante esse período, apenas as candidaturas legalmente admitidas (partidos, coligações e grupos de cidadãos eleitores) poderão desenvolver ações de propaganda política, com os meios e formas permitidos pela legislação.
Neste contexto, os municípios devem garantir que:
Responsabilidades e riscos
O incumprimento destas normas pode levar a:
Por esta razão, recomenda-se a todos os serviços municipais — com especial incidência nos gabinetes da presidência, comunicação, cultura, obras, ação social e eventos — que procedam a uma revisão preventiva das ações e planos previstos para os meses de agosto, setembro e outubro, avaliando o seu enquadramento legal e a sua compatibilidade com o regime de neutralidade institucional.