Consultado o Relatório Anual da Contratação Pública de 2024 constata-se, uma vez mais, numa continuidade que se regista há anos, a importância fundamental da contratação pública, nomeadamente no que tange ao “Peso na Economia”, constante do seu ponto 3.
Nele regista-se, designadamente, que “No ano de 2024, o peso dos valores contratuais comunicados ao portal BASE representou 6,46% do PIB, indicador que mede a atividade produtiva agregada, que, face ao ano anterior, representa um acréscimo de 0,74 pontos percentuais, mantendo assim a tendência de crescimento já verificada em 2023”.
Em termos de procedimentos, mantém-se também uma realidade pouco concorrencial, face à “maior incidência no tipo de procedimento por ajuste direto, seguido do procedimento por consulta prévia, concretamente: 112.024 ajustes diretos e 41.321 consultas prévias que, em conjunto, correspondem a 76% do total dos procedimentos”.
Servem estas evidências, que aqui se recordam, para expressar que o problema da contratação pública não está propriamente no Direito, mas na prática, que foge dele, apesar da importância vital para a satisfação das necessidades coletivas, boa administração e boa gestão do dinheiro de todos nós (pois é disso que se trata quando falamos de dinheiro público).
Por isso, deve exigir-se ao legislador que não contribua para “mais confusão”, o que implicaria não estar todos os anos a “mexer” na principal legislação, sob pena de óbvia incerteza e insegurança jurídica que cria aos seus aplicadores diários. Sendo certo que, conforme é sabido, aproxima-se mais uma revisão ao Código por via da alteração às Diretivas de Contratação Pública.
Porém, não é isso que tem acontecido desde 2008, ano do advento do Código dos Contratos Públicos (o qual sofre a 15.ª alteração, praticamente à média de uma por ano...), tendo sido novamente publicado um diploma legal, o Decreto-Lei n.º 112/2025, de 23 de outubro, que flexibiliza regras de contratação pública, alterando a Lei n.º 30/2021, de 21 de maio (medidas especiais), e o Código dos Contratos Públicos (CCP). E promete-se mais alterações...
Fiquemos pelas ora publicadas.
Alterações ao CCP
Recordando que há muito vinha sendo tentada, pelo legislador, a normalização, no seio das empreitadas de obras públicas, da modalidade de conceção-construção (excecional nos termos do n.º 3 do artigo 43.º do CCP), em contraciclo com o entendimento de vários agentes, a começar pelo Tribunal de Contas, finalmente tal desiderato foi alcançado.
Procede-se à alteração do artigo 43.º do CCP, passando as entidades adjudicantes a poder recorrer à figura da conceção-construção não apenas em casos excecionais e devidamente fundamentados, mas sempre que, segundo juízos de discricionariedade e à luz dos interesses públicos em presença, concluam pela adequação daquela modalidade contratual.
Neste sentido, a entidade adjudicante pode prever a elaboração do projeto de execução como aspeto da execução do contrato a celebrar, caso em que o caderno de encargos deve ser integrado apenas por um programa preliminar (ver Portaria 255/2023), de 7 de agosto) e o preço base nele definido deve discriminar separadamente os montantes máximos que a entidade adjudicante se dispõe a pagar pela execução das prestações correspondentes à conceção e à execução da obra.
Em consequência, o artigo 2.º-A da Lei n.º 30/2021 (que havia sido aditado pelo Decreto-Lei n.º 78/2022, de 7 de novembro), é revogado (em 2025), deixando a conceção-construção de estar nas medidas especiais, passando a figurar com normalidade no CCP.
Alterações às Medidas Especiais (Lei n.º 30/2021)
Paralelamente, entende-se que os efeitos desta medida relativa à “conceção-construção” podem ser potencializados mediante aumento, a título excecional, dos limiares para a adoção dos procedimentos de consulta prévia e ajuste direto, no âmbito da celebração de contratos que se destinem à promoção de habitação pública ou de custos controlados.
Assim, procede-se à alteração das medidas especiais de contratação pública referentes à formação de contratos em matéria de habitação, previstas no artigo 3.º da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, admitindo-se, até 31-12-2026, procedimentos simplificados específicos:
- até € 60.000 (inclusive) para contratos de empreitada ou concessão;
- até € 30.000 (inclusive) para contratos de locação e aquisição bens/serviços;
- até € 65.000 (inclusive) para os outros contratos.
E assim se introduzem novas alterações legislativas, aplicáveis aos procedimentos de formação de contratos públicos iniciados após a sua data de entrada em vigor, ou seja, cuja decisão de contratar (cfr. artigo 36.º, n.º 1 do CCP) seja praticada a partir de 28.10.2025.