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Administradores Trabalhadores: Compatibilidade e Consequências Jurídicas
Imprensa
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in Executive Digest
23 mai 2025

Administradores Trabalhadores: Compatibilidade e Consequências Jurídicas

Administradores Trabalhadores: Compatibilidade e Consequências Jurídicas

Nas pequenas e médias empresas (PME), é comum que um trabalhador também assuma funções de administração. Este artigo analisa a compatibilidade entre os dois papéis, as consequências jurídicas da acumulação de funções, o enquadramento na segurança social e as diferenças entre as posições de administrador e trabalhador.

Os administradores são eleitos pela assembleia geral para gerir e representar uma sociedade anónima (SA), tomando decisões estratégicas e assegurando o cumprimento dos objetivos sociais. 

Incompatibilidade entre as Funções

O artigo 398.º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais (CSC) proíbe que alguém exerça simultaneamente funções de administrador e trabalhador na mesma empresa ou em sociedades do mesmo grupo.

  • Administrador: exerce poder de direção e representação da empresa.
  • Trabalhador: está sujeito a ordens, sob subordinação jurídica.

Como afirma Paulo Tarso, “O administrador não pode mandar às 2ªs, 4ªs e 6ªs feiras e ser mandado às 3ªs, 5ªs e Sábados.” A essência da incompatibilidade está em não poder haver auto-subordinação.

Nomeação de Trabalhador como Administrador:

A nomeação de um trabalhador para o cargo de administrador de uma sociedade comercial acarreta implicações específicas no seu contrato de trabalho, conforme previsto no artigo 398.º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais (CSC).

 

Regime Jurídico e Evolução Jurisprudencial

Originalmente, o artigo 398.º, n.º 2, do CSC estabelecia uma distinção com base na antiguidade do contrato de trabalho:

  • Contratos com menos de um ano: A nomeação para administrador implicava a extinção automática do contrato de trabalho.
  • Contratos com mais de um ano: O contrato era suspenso durante o período de exercício do cargo de administrador. Contudo, o Tribunal Constitucional, através do Acórdão n.º 723/18, declarou a inconstitucionalidade da norma que previa a extinção automática dos contratos com menos de um ano de antiguidade, por violação de direitos laborais fundamentais.

 

Regime Vigente (Após 27 de janeiro de 2020)

Em consequência da decisão proferida pelo Tribunal Constitucional, o regime atualmente em vigor, desde 27 de janeiro de 2020, estabelece que todos os contratos de trabalho são suspensos durante o período em que o trabalhador desempenha o cargo de administrador, independentemente da antiguidade do contrato. Esta alteração jurisprudencial representa um avanço significativo na proteção dos direitos laborais, ao impedir a extinção do vínculo laboral motivada pela nomeação para o cargo de administrador, assegurando a continuidade da relação laboral após o término das funções de administração.

 

Regime de Segurança Social

A nomeação como administrador altera o enquadramento contributivo:

  • Mais de um ano de antiguidade: mantém-se no regime geral dos trabalhadores por conta de outrem.
  • Menos de um ano: integra o regime dos membros dos órgãos estatutários (MOE).

 

Diferenças Cruciais entre Administrador e Trabalhador

1. Destituição vs. Despedimento

  • Administrador: pode ser destituído a qualquer momento, sem justa causa.
  • Trabalhador: só pode ser despedido com justa causa ou por motivos legalmente previstos e sujeitos a formalidades.

2. Compensação por Cessação de Funções

  • Administrador: compensação é totalmente tributada.
  • Trabalhador: há isenção parcial, até certos limites definidos no Código do IRS.

3. Subsídio de Desemprego

  • Administrador: acesso restrito e condicionado à cessação involuntária por motivos objetivos (ex.: insolvência).
  • Trabalhador: acesso mais amplo, desde que a perda do emprego seja involuntária.

Considerações Finais

A questão dos “administradores trabalhadores” é complexa e exige uma análise cuidadosa das normas legais e da jurisprudência. A incompatibilidade entre as funções de administrador e trabalhador visa proteger os interesses da sociedade e evitar conflitos de interesses. A suspensão do contrato de trabalho, em vez da sua extinção, representa um avanço na proteção dos direitos dos trabalhadores. É fundamental que as empresas e os profissionais do direito estejam atentos às nuances deste regime, para garantir a conformidade legal e a proteção dos direitos de todas as partes envolvidas.